Em uma linda
tarde de sol, saí para espairecer com minha filha. Espairecer na linguagem
feminina significa bater perna no shopping. Era um dia de semana, então tinha
que me apressar, já que na volta deveria pegar meu filhote na escola, no fim da
tarde, às 18:00, porque o mesmo faz karatê, depois da aula.
Como não tirei a carteira de motorista
e entro em pânico só de abaixar o freio de mão, minha peregrinação rumo ao
trânsito de Salvador teria que ser de ônibus,
no meu caso caso, já que moro em área de difícil acesso, de micro-ônibus.
Não demorou muito e o transporte
chegou, no entanto cheio demais e ainda por cima circularia por todo bairro, invadindo
ruas, dobrando quadras inteiras. Pegá-lo não seria interessante, pois atrasaria
meu retorno. Resolvo ir andando ao ponto anterior, na esperança de encontrar um
veículo mais vazio.
Finalmente ele aparece, não tão cheio
quanto os anteriores, mas o suficiente para me deixar em pé. Entro a procura de
um lugar e nada, num jogo rápido de olhos, procuro algum jovem vestido de azul,
camisa da cor dos alunos da escola pública. Encontro pelo menos 4, resolvo
ficar na direção de um deles, do lado da porta, caso ele saia e eu achava que
sairia logo, já que há inúmeras escolas públicas no trajeto. Minha filha fica
do lado oposto e eu a oriento a procurar um estudante.
Depois de alguns quilômetros
percorridos, justamente onde imaginaria que a estudante desceria, os três
descem no ponto, menos a aluna que estava na minha direção. Minha filha senta, mas
a essa altura, o ônibus já estava lotado e não havia como sentar no lugar dela.
Folga uma
cadeira no fundo, mas resolvo ficar, na firme certeza de que a menina desceria
logo. Nada. Todos os lugares do lado que estava são desocupados e logo
substituídos por outros passageiros, menos o meu.
Já olhava pra
menina como se fosse a pessoa mais detestável que já havia visto. O cabelo era
horrível, cheio de creme e completamente danificado, a sandália um pouco suja,
aparentando desleixo; um celular novo, mas com um péssimo gosto musical - na
faixa - só músicas depreciativas. Enfim,
desferia um rosário de defeitos imperdoáveis àquela garota, com ar indiferente,
sentada a minha frente.
Eu já achava
que ela sabia da minha intenção, porque olhava no canto do olho e se remexia
insistentemente, dando-me a impressão de que iria se levantar a qualquer momento.
Colocava o celular na bolsa e fazia movimentos erguendo a coluna, o que me
enchia de esperança.
Já chegando
perto do meu ponto, percebo que ela tinha vencido essa guerra fria e quando o
motorista parou o carro, ela olhou pra mim, levantou e me deixou mais chateada
do que eu estava, por duas constatações insuportáveis: primeiro, que havia
perdido aquela batalha, já que ela nunca teve a intenção de descer antes de
mim, visto que ia descer no mesmo ponto que eu; e a segunda, talvez a mais
dolorosa, é que a camisa dela era de uma
loja do shopping.