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domingo, 10 de setembro de 2017

NO ÔNIBUS

Em uma linda tarde de sol, saí para espairecer com minha filha. Espairecer na linguagem feminina significa bater perna no shopping. Era um dia de semana, então tinha que me apressar, já que na volta deveria pegar meu filhote na escola, no fim da tarde, às 18:00, porque o mesmo faz karatê, depois da aula.
         Como não tirei a carteira de motorista e entro em pânico só de abaixar o freio de mão, minha peregrinação rumo ao trânsito de Salvador teria que ser de ônibus,  no meu caso caso, já que moro em área de difícil acesso, de micro-ônibus.
        Não demorou muito e o transporte chegou, no entanto cheio demais e ainda por cima circularia por todo bairro, invadindo ruas, dobrando quadras inteiras. Pegá-lo não seria interessante, pois atrasaria meu retorno. Resolvo ir andando ao ponto anterior, na esperança de encontrar um veículo mais vazio.
    Finalmente ele aparece, não tão cheio quanto os anteriores, mas o suficiente para me deixar em pé. Entro a procura de um lugar e nada, num jogo rápido de olhos, procuro algum jovem vestido de azul, camisa da cor dos alunos da escola pública. Encontro pelo menos 4, resolvo ficar na direção de um deles, do lado da porta, caso ele saia e eu achava que sairia logo, já que há inúmeras escolas públicas no trajeto. Minha filha fica do lado oposto e eu a oriento a procurar um estudante.
       Depois de alguns quilômetros percorridos, justamente onde imaginaria que a estudante desceria, os três descem no ponto, menos a aluna que estava na minha direção. Minha filha senta, mas a essa altura, o ônibus já estava lotado e não havia  como sentar no lugar dela.
Folga uma cadeira no fundo, mas resolvo ficar, na firme certeza de que a menina desceria logo. Nada. Todos os lugares do lado que estava são desocupados e logo substituídos por outros passageiros, menos o meu.
Já olhava pra menina como se fosse a pessoa mais detestável que já havia visto. O cabelo era horrível, cheio de creme e completamente danificado, a sandália um pouco suja, aparentando desleixo; um celular novo, mas com um péssimo gosto musical - na faixa - só músicas depreciativas.  Enfim, desferia um rosário de defeitos imperdoáveis àquela garota, com ar indiferente, sentada a minha frente.
Eu já achava que ela sabia da minha intenção, porque olhava no canto do olho e se remexia insistentemente, dando-me a impressão de que iria se levantar a qualquer momento. Colocava o celular na bolsa e fazia movimentos erguendo a coluna, o que me enchia de esperança.

Já chegando perto do meu ponto, percebo que ela tinha vencido essa guerra fria e quando o motorista parou o carro, ela olhou pra mim, levantou e me deixou mais chateada do que eu estava, por duas constatações insuportáveis: primeiro, que havia perdido aquela batalha, já que ela nunca teve a intenção de descer antes de mim, visto que ia descer no mesmo ponto que eu; e a segunda, talvez a mais dolorosa, é  que a camisa dela era de uma loja do shopping.